terça-feira, 10 de novembro de 2009

Uma Classe que Voou...
(Conto de Minha Mãe)




Amigas/os

Passa hoje mais um aniversário natalício de minha Mãe, que, se ainda estivesse entre nós, completaria 89 anos de idade.

Tendo já assinalado este dia em anos precedentes dando algo a conhecer da sua história e publicando algum que outro poema ou texto – pois infelizmente ela destruiu a maioria deles – gostaria hoje de convosco partilhar uma pequena história, por ela escrita aquando da sua aposentação do Colégio Valsassina, em 1987.

Minha Mãe leccionou nesse Colégio como professora efectiva da então “4ª classe”, desde 1952 a 1987, com um intervalo de 3 anos devido ao meu nascimento em 1957. Mas já desde 1940 percorrera várias escolas, ensinando nomeadamente em pequenas aldeias alentejanas.

O ano passado aqui ficou um pequeno relato referindo-se às suas primeiras “lições”, dadas aos catorze anos, a uma pequenita de Estremoz, terra de onde minha Mãe era natural.

Este ano, aqui deixo mais um texto dos muito raros que dela me ficaram, e também dedicado aos seus queridos alunos – desta vez, os do Colégio Valsassina. Uma viagem imaginária, fantástica... uma classe inteira que "voou" nas asas do sonho de minha Mãe, quando teve de abandonar a "Aula" que foi a sua segunda casa durante quase cinquenta anos.




* * * * *


SONHO ou REALIDADE ?

“Uma classe que voou...”



...”Aquilo”, ali, estava mergulhado numa semi-obscuridade...
...Aos poucos se foram desenhando alguns contornos.


- Onde estava eu?
Por força tinha de estar na aula. Era aí o meu lugar de sempre! ...Mas... ah! - havia ali carteiras e das mais antigas...
Nelas, algumas silhuetas se desenhavam...


Tinham de ser dos meus alunos e também isto seria “por força”. Pois de quem mais poderiam ser?
Então era preciso começar a aula!


... Mas ... uma súbita mudança de nível nos sacudiu e surpreendeu. Então estávamos a levantar voo?!


- Tenho medo, murmurou uma vozinha de criança.


- Não sejas pateta! - lhe respondi. Parece-me que iremos fazer uma bonita viagem aérea...


Afinal, “aquilo” não era senão um esplêndido avião e nós estávamos numa sala com outros passageiros.
E todos se riam porque aquele amigo tivera receio de uma viagem assim... receio de uma viagem aérea!


... Lá, de cima, eu e a minha turma, podíamos observar a surpreendente beleza da superfície terrestre...
Era a verdura deslumbrante das relvas, e cor avermelhada dos arruamentos muito limpos serpenteando por entre jardins povoados de florinhas multicolores... mais ao longe , alguns aglomerados de casinhas muito brancas...


Tudo se ia esfumando numa bruma indefinida, não nos permitindo reflectir em pormenores que, certamente existiriam.
Bruscamente nova mudança de nível! Ai! Desta vez estávamos a descer vertiginosamente!


- Vamos aterrar? - perguntou alguém ao meu lado...


Houve apertos e encontrões mas todos riam. Riam, mesmo da cabeçada que eu dera, ali não sei onde e que me fizera apertar e cabeça entre as mãos!


A grande velocidade chegámos à Terra.



E sabem onde viemos aterrar?
Foi aqui, no Colégio Valsassina, e no “campo da bola”...
Não podia haver melhor lugar para as crianças ficarem e que felizes ficámos todos!


... Tudo tinha sido tão misterioso... Afinal estávamos num sítio seguro!

Este sonho levou-me a considerar que por vezes os sonhos poderão relacionar-se com factos reais.
Quanto a mim, concluo que, na realidade, houve uma classe que voou.
Voou a professora e logo voaram os alunos para a continuação da sua viagem.



Que a sua viagem real os conduza a bom porto e que, para todos eles, ela lhes seja tão profícua quanto o sentido da palavra possa sugerir.



Vocabulário “Fantástico”


Avião – sala de aula
Silhuetas - crianças (vultos)
Semi-obscuridade – indefinição do sonho
Apertos e encontrões – coisas que as crianças gostam de fazer...
Verdura com arruamentos – jardim da D.ª Marinela (Directora do Colégio nessa época)
Voo da Professora – foi-se embora...
Voo dos alunos – continuação das aulas com a nova Professora



Carlota/
( 1987 )








14 comentários:

Teresa David disse...

Uma graça o texto da tua mãe. Ainda por cima tinho o nome da minha avó paterna: Carlota.
Bjs
TD

Jorge P. Guedes disse...

BELAS MEMÓRIAS E TERNA HOMENAGEM!

UM ABRAÇO, DESEJANDO QUE POR AÍ A SAÚDE VÁ DANDO "P'ROS GASTOS".

pin gente disse...

UM BOM MOTIVO PARA UM VOLTA.
UM BEIJO

MARIA LEIRIA disse...

Obrigada.
Beijinho
:-)
O

M C disse...

QUERIDA LEONOR,

LINDÍSSIMO O TEXTO QUE A TUA MÃE ESCREVEU E QUE SORTE A NOSSA DE PODERMOS PARTILHAR ESTAS PRECIOSAS "FOLHAS" QUE COM TANTA TERNURA GUARDASTE AO LONGO DE TODOS ESTES ANOS. ADOREI, LEONORETTA!

ESPERO QUE ESTEJA TUDO BEM C0NTIGO E COM O TEU QUERIDO E ADMIRÁVEL PAI.

UM GRANDE BEIJINHO PARA TI (FILOUS)
TERESA

ASPÁSIA disse...

AMIGAS/OS

MUITO GRATA E COMOVIDA COM OS VOSSOS TERNOS COMENTÁRIOS, TANTO MAIS QUE ESTE ANO FOI UM ANIVERSÁRIO PARTICULARMENTE TRISTE, DADO QUE NO DIA SEGUINTE SE REALIZOU A EXUMAÇÃO DOS RESTOS MORTAIS DE MINHA MÃE.
ASSIM NOS APERCEBEMOS QUE POUCO OU NADA FICARÁ DO QUE FOMOS EM VIDA, A NÃO SER AS MEMÓRIAS QUE DEIXARMOS.

ABRAÇOS E BEIJINHOS GRANDES PARA TODOS.

LEONOR

Elvira Carvalho disse...

Muito bonito o texto da sua mãe.
E bonita a sua homenagem a sua mãe.
Espero e desejo que o sr. seu pai esteja bem, e deixo um abraço para os dois.

Jorge P. Guedes disse...

PASSO E DEIXO UM ABRAÇO.

Mare Liberum disse...

Bonito conto este da tua mãe.Recordações ternas que jamais esquecerás e cuja leitura me deixou deliciada. Os professores são uns sonhadores e enquanto sonham o mundo pula, avança e fazemos voos fantásticos.

Beijinhos para pai e filha

Bem-hajam!

Jorge P. Guedes disse...

RESTA-ME DEIXAR UM GRANDE ABRAÇO.

pin gente disse...

para te deixar um beijo, amiga.


luísa

Jorge P. Guedes disse...

De passagem, deixo um abraço e votos de muita saúde aí por casa.

Elvira Carvalho disse...

Passei por aqui.
Deixo um abraço para dois.

Maria João Brito de Sousa disse...

MAIS UM BLOG QUE ME PARECE INTERESSANTÍSSIMO! OBRIGADA,
ASPÁSIA!