segunda-feira, 26 de junho de 2006

Catedral


Catedral de León (Espanha)

Olhando ao longe a planura,
numa manhã outonal,
ergue-se a alta figura,
– Pai-Nosso em arquitectura –
duma antiga catedral.

É visão inesquecível,
aguarela austera e pura.
Majestosa, imperecível,
por artesão intangível
talhada na pedra dura.

Acerco-me lentamente
e em grandeza vai crescendo.
Sobre a pedra que não mente,
olho mais atentamente,
velha inscrição desvendo.

Sé pelo Homem erguida
para dar a Deus sinal
de fé na Lei recebida,
é promessa nesta vida,
esperando na Vida imortal.

Lugar de meditação,
abriga no coração
a qualquer que nela entre.
Não vê cor ou condição
nem mesmo faz distinção
entre o crente e o não-crente.

Cruzando o largo portal,
entro, sem fazer rumor.
Coalhado dum vitral,
irisa a água lustral
um reflexo multicor.

Sobre o altar principal,
em retábulo pintado,
o Anjo celestial
ergue a pedra sepulcral
a Jesus ressuscitado.

Oiço vozes de oração
que se elevam em espiral.
Pedirão, talvez, perdão,
ou tão só resignação
para tanta dor e mal.

O velho órgão harmoniza
um cântico angelical.
Não pede, não catequiza,
mas dá alma a quem precisa
– Sinfonia Pastoral.

Fôra eu crente e, talvez,
no meio desse coral
encontrasse a placidez,
esquecendo os mil porquês
da Ciência racional.

Assim, enquanto a visito,
não rezo, apenas medito,
banhada na luz claustral:
pudesse o caos inaudito,
ferro e dor, espanto e grito,
pesadelos do real,
dar lugar a um coral
– eco humano de Infinito…
e o Mundo enfim sem conflito,
mais perto do Ideal,
vogasse no mar infindo
do azul universal.

L.N. 96



"Allein Gott in der Höh´ sei Ehr" - J.S. Bach
(Otto Winter - Órgão)

22 comentários:

thorazine disse...

Por acaso já lá estive! Bem bonita a Catedral de Léon, mas o que gostei mais foi a Casa Botines e o Palácio Episcopal em Astorga, de Gaudi. Fantástico. Gostava de poder ir a barcelona ver o resto..

APC disse...

Magníficos versos!
... Sua estrutura sonora, palavras-flechas-à-alma, tudo muito bom de se sentir e tão difícil de dizer assim, em rima que é pintura.
E excelente tema, escolheste!
O barroco de Bach (o Sebastian, não o clássico Christian), como pano de fundo desta construção gótica apenas conhecia de nome!
Muito bem :-)))

APC disse...

* que apenas conhecia de nome

Anónimo disse...

O mundo ultraterreno confesso que também me interessa, mas não acredito... Como não fazê-lo diante a luz dessa abóboda que conquistaste à História?....

Pamina disse...

Olá Aspásia,

Gostei muito do teu poema, especialmente da última estrofe. Já tenho sentido o mesmo.
Um beijinho.

ASPÁSIA disse...

Thora

Aúnque bien que te hice volver a esos bellisimos recuerdos...

Besos:)

APC

Grata pelos elogios a uma Aspásia com menos 10 anos, apesar de ter feito agora uns retoques na última estrofe...

Beijinhos barrocos;)

Frei Cecílio

É sempre bem-vindo a esta humilde capela, mesmo que disfarçada de catedral, e onde uma ateia vai tecendo a sua teia...

Orate pro mecum, frates...;))

Pamina

Es freut mich dass du hast geliebt, Freundin, ein bisschen Kathedrale Musik mit mir zu hören...

Gutes Wochenende Kusje:)

APC disse...

Não acredito que tenham mandado um frade orar para o Meco!!! :-(

;-)

ASPÁSIA disse...

APC

Ipso factum!!! Seria orate pro me, visto que mecum é "comigo"... isto por que me lembro daqueles livrinhos chamados "Vademecum" - vai comigo...

Assim para convidar um frade a ir ao Meco, será:

Frates, vade mecum ad Mecum!!! (solum pro orationes!)

;-))

Pamina disse...

Passei para te desejar bom fds e fiquei a ouvir outra vez a música. Fechando os olhos, dá quase para me imaginar em Óbidos, na Igreja de Santa Maria, a ouvir o rebento. Claro que o "teu" órgão é melhor e o organista também (sou uma mãe desnaturada:)).
Beijinhos.

ASPÁSIA disse...

Olá Pamina

Tudo é relativo... mas olha que o rebento também não vai nada mal, pelas amostras...

Goed Wochenende

Kusje

APC disse...

Ainda assim, a orar, a orar...
;-)

APC disse...

E era Meco, era Meco; não quero saber!
Et quod scripsi scripsi, prontxxx! (depois é o tanas para recuperar o status quo ante, lol).
Eheheh... Epistolae non rubescent, é o que nos vale! :-)
Renovo parabéns pela tua scientia bene dicendi, e despeço-me, sine die, com bjufas, ex corde.

ASPÁSIA disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
ASPÁSIA disse...

APC

Malo, malo, malo, totum percorrere pontum, quam malo cum malis mandere, malo malis.

Trad.: Mais quero atravessar um mau mar num mau mastro [barco] do que comer más maçãs com más queixadas.

Frase aprendida com meu Pai e que lhe foi ensinada em tempos por um antigo latinista numa tertúlia num café que ficava ao Rossio, ao pé do Café Nacional.

Alea jacta est!

Ave, oscularum te, sores...;)))

fiury disse...

aspásia

para quando um livro de poesia?
também achei imensa graça ao desespero da sua empregada, no murcon!

fiury

APC disse...

Eheheheheh
Calatita ficum! ;-)
Jokas &... Aparece. Os meus poemas não os poderás ler debaixo da romanzeira onde poisam os amores (e é pena), mas por entre a densa camuflagem, que se entreabre à passagem dos olhares atentos como o teu.

ASPÁSIA disse...

Fiury

Pois, esse livro está em embrião, mas metem-se tantas coisas... depois de 10 anos com problemas nos olhos, como descrevo no início do blog "Olho Seco", e da doença durante cinco anos de minha Mãe e seu falecimento, só no início deste ano tive melhoras suficientes a nível dos olhos e tempo para entrar neste reino da blogosfera... e ir mostrando alguns dos poemas, a maioria feita entre 1990 e 1998.
Entretanto meu Pai, apesar de gozar de bela saúde, está com 92 anos e tento recolher em formato digital alguma da sua obra no campo do Xadrez (composição artística e livros), Poesia e Música.
De modo que por enquanto o meu livro vai esperar mais um pouco e vou colocando poemas por aqui.

Obrigada pelas suas palavras.
Grande beijinho:))

ASPÁSIA disse...

Querida APC

Isto é que tem sido, um latinório!!! Em breve vou pôr uma coisa muito gira nesse campo...

Se quiseres, lê também o que eu disse à Fiury e compreendes que por vezes a razão das minhas visitas não serem tão assíduas como desejaria.

Então estes 2 dias passados fiz uma empreitada para acabar de ler "O Tempo dos espelhos" do nosso Prof. e hoje estou com algumas dores nos olhos. Para mim é pior ler papel que no PC, pois neste posso configurá-lo à minha maneira e caso necessário pôr o leitor de ecran... mas não podia esperar que o livro seja digitalizado.

E fiquei impressionada com o livro. Não fazia ideia do esforço que o JMV fez ao longo destes anos para nos mostrar sempre cara alegre, apesar das tragédias familiares que sofreu e ainda sofre. Todos as sofremos, em maior ou menor grau, é certo; apesar de tudo o caso de minha Mãe, sendo mau, não foi dos piores. O estado da Maria Clara, uma morte em vida é de facto impressionante. Felizmente ainda pude cumprimentá-la duas vezes e falar ao telefone uma vez.
Se não a ouviste cantar, recomendo vivamente. Era uma Senhora na Vida e na Canção.

Desculpa este desabafo que não vimha muito a propósito.

Um grande beijo e lá aparecerei, detrás de algum arbusto...;)

ASPÁSIA disse...

"tem sido um latinório"
"vinha"

APC disse...

Aspásia, obrigada pelas palavras.
Náo só conheço - e muito aprecio - o repertório de Maria Clara, como, ainda que muito indirectamente, algumas histórias do seu percurso. Desde que me iniciei nas esferas de que o JMV é tão ilustre ensinante, que sei quem foi a sua mãe (cá em casa sempre se ouviu, e já deves ter sentido que eu sou uma menina que mistura épocas, lol), mas nunca o evidenciei no Murcão, não só porque tal não se oferecia por pertinente, mas, sobretudo, precisamente porque o tema é sensível e íntimo ao/do seu filho, um homem "cheio" de coisas tantas, que vai dando à mendida que sabe, pode e quer.
O que me dizes - sobre o livro, sobre tudo isto - é para mim uma novidade, pois envergonhadamente assumo que desconhecia o seu teor, ainda que há muito esteja para o adquirir, ademais tendo em conta os comentários que vou lendo. O respeito imenso já cá estava, mas em muito contribuis para a urgência da minha vontade em lê-lo.
"Perdoo-te" este e quaisquer outros desabafos, porque assim é que é! Assim é que somos! :-)
Força com as tuas coisas & um grande abraço.

andorinha disse...

Gostei imenso do poema, Aspásia.
Espero poder vir a ler muitos mais.:)
Entretanto deixo-te um beijinho e o desejo de um óptimo fim-de-semana.

Anónimo disse...

Once upon a time there were four little Rabbits, and their names were-- Flopsy, Mopsy, Cotton-tail, and Peter.

They lived with their Mother in a sand-bank, underneath the root of a very big fir-tree.

"Now, my dears," said old Mrs. Rabbit one morning, "you may go into the fields or down the lane, but don't go into Mr. McGregor's garden: your Father had an accident there; he was put in a pie by Mrs. McGregor."

"Now run along, and don't get into mischief. I am going out."

Then old Mrs. Rabbit took a basket and her umbrella, and went through the wood to the baker's. She bought a loaf of brown bread and five currant buns.

Flopsy, Mopsy, and Cotton-tail, who were good little bunnies, went down the lane to gather blackberries;

But Peter, who was very naughty, ran straight away to Mr. McGregor's garden, and squeezed under the gate!
Good morning